Meus pais me contavam
histórias. Eles diziam que, há cem anos, os nossos antepassados Drakkars se
enfrentaram de uma forma tão aterradora que quase se aniquilaram e, claro,
quase levaram a raça humana à extinção.
Segundo minha avó, aquele
acontecimento era das mesmas proporções de um que havia acontecido há mais de
quatro mil anos, o que mostrava um ciclo natural de controle da nossa
população. Esse controle era exercido por uma Ordem que também quase fora destruída
por completo, mas tinha sido reerguida pela última de suas iniciadas, a Última
Luz do Protetorado. Os Protetores, como eu os conheci, através de histórias de
terror contadas por meus parentes, sempre permearam meus pesadelos. Encontrar
um deles era, para nossa espécie, a morte certa. Não tínhamos como enfrentá-los
nem como fugir. Se eles nos descobrissem, era o fim. Então, toda nossa outrora
orgulhosa raça havia sido reduzida a apenas pessoas comuns, fazendo coisas
comuns, escondendo sua verdadeira natureza Drakkar. Não podíamos usar
habilidades que, segundo diziam, eram quase sobrenaturais. Que eu, sendo uma
Drakkar Vermelha, poderia criar e mover o fogo de formas tão poderosas que eram
quase inimagináveis para nossos contemporâneos.
Assim, para mim, com meus
dezessete anos, sem todas essas possibilidades incríveis, restava fazer o teste
para ser treinada por uma agência musical, sonhando me tornar uma estrela
mundialmente famosa.
– Mariana... – chamou-me a
olheira que fazia o teste.
Eu era a primeira.
Fazia uma semana que havia
chegado a Basiléia, na Suíça, para o teste e, claro, fazia meses que eu
treinava e ensaiava para ele; afinal, aquela não era qualquer agência. A LRD
era a maior e mais conceituada agência musical do planeta.
Junto comigo outras garotas e
garotos também prestavam aquele teste, mas sabíamos que somente quatro de nós
passariam, para seguir com o treinamento.
– Apresente-se – disse outro
olheiro que estava junto na bancada dos jurados.
– Eu... – respirei fundo – Eu
me chamo Mariana Silva dos Santos. Sou do Brasil. Nasci em vinte e cinco de
Maio de dois mil cento e vinte e nove, e tenho dezessete anos. Tenho um metro e
sessenta e seis centímetros, e peso quarenta e oito quilos.
Eles me olharam de cima a
baixo, como se me classificassem.
Como Drakkar, mesmo sem os
poderes especiais que diziam termos, sabia que minha biologia fazia com que meu
corpo estivesse sempre no ápice da sua saúde física. Eu jamais havia ficado
doente, nem me machucado. Não possuía nenhuma cicatriz, manchas ou qualquer
outra coisa. Porém, olhando a maioria dos outros concorrentes, de cabelos
claros ondulados e cacheados, olhos coloridos e pele alva como uma porcelana,
parecia difícil competir com minha pele escura, de cabelos lisos grossos e
pretos, com olhos negros e rasgados. Eu destoava deles de tal forma que era
provável que jamais tivesse chance de passar no teste.
– O que tem para nós? –
perguntou a olheira.
Eles continuavam me olhando
como se vissem através de mim. Como se pudessem enxergar minha alma. Então expliquei
que apresentaria um número com canto e dança, tal como eles esperavam, e
comecei a fazê-lo.
Durante a apresentação, o
nervosismo que estava sentindo desapareceu e tudo o que eu conseguia pensar era
na beleza de compartilhar aquela arte com todo o mundo.
– Pode parar – disse a olheira
levantando a mão – Ande em linha reta até nós... – ela desenhou no ar o caminho
até a frente deles.
Eu me posicionei e segui, como
um desfile, de queixo erguido, olhar firme e andar suave. Parei em frente a
eles e aguardei.
Os jurados se reuniram e
cochicharam por uns instantes.
– Você tem esse aspecto
tropical – disse a olheira – E anda como um felino... O que acha de ser
apelidada de Puma? – ela perguntou de supetão.
– Puma... – dei de ombros –
Acho um nome bonito... – disse sem saber direito o que comentar.
– Aqui – ela me entregou um
papel – Você está selecionada e...
– Sério? – gritei de emoção.
Meu coração estava disparado.
Aquilo parecia surreal. Não
podia acreditar.
– Sim – ela continuou depois
que eu a interrompi – de agora em diante você fará parte da nossa agência e
treinará com os melhores. Por favor... – ela apontou para o lado onde quatro
cadeiras esperavam seus respectivos donos.
Todos os outros competidores
bateram palmas.
Segui para uma das cadeiras e
me sentei. Ria feito boba, e tremia.
Durante três dias exaustivos
de testes, acabei conhecendo minhas companheiras de treinamento conforme iam
passando no teste. Contrariando o que eu achei que fosse acontecer, no fim,
acabou que éramos uma de cada canto do mundo. Todas lindas.
Nyala era da Etiópia, sua pele
preta parecia um veludo perfeito e seus cabelos trançados, tinham um aspecto muito
bonito e estiloso. Sera Brown era da Austrália e também era linda. Seus olhos
azuis e seus cabelos platinados cortados na altura dos ombros a deixavam com
uma aparência elegante e muito imponente. A última, Seong-Ja, era da Coréia e,
claro, sua vantagem era que, como o formato musical mais difundido no mundo
havia nascido no seu país, ela tinha uma habilidade natural para o sucesso. Seu
rosto pequeno, fino e esbelto, e seus longos cabelos pretos e sedosos, faziam
dela, certamente, nossa integrante mais visual. Claramente seria a “cara” do
nosso grupo.
No fim dos testes, depois de
nossos pais assinarem os contratos com a agência e fazermos nossas despedidas
chorosas e cheias de emoção, fomos embora morar juntas em uma casa, num local
remoto esquecido por todos. Treinaríamos, como disseram os olheiros, noite e
dia e seríamos o grupo mais famoso do mundo. Eles se certificariam disso. E
nós, sabendo do poder daquela agência, não duvidávamos.
A Saga Draconiana - Fragmentos
Draconianos
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A. G. Olyver